ELA eu e elas
Orlando Jorge Silveira da Silva, 38 anos, é natural de Lisboa e bombeiro sapador desde os 22, profissão que teve que interromper quando a vida decidiu pregar-lhe uma partida. Orlando, conheceu a sua companheira, Marta Rocha Santos, em 2013, na Costa de Caparica e nunca mais se separaram. “Começámos a namorar em 2013, a relação foi crescendo e cedo deu frutos”. Da vida a dois nasceram os seus dois tesouros, as filhas Carolina e Inês, de 4 e 5 anos. Lando, como é conhecido, desempenhava atualmente a função de mergulhador. “Estive catorze anos na linha da frente onde salvamos pessoas, animais e bens”, mas nestes últimos tempos tinha passado para a atividade de mergulho em que me dedicava mais a resgates de pessoas e viaturas”. Num dos muitos dias em que saiu de casa para fazer exercício junto ao mar, começou a sentir fasciculações nas pernas, fadiga e cãibras. “Comecei por sentir o corpo a tremer, mas não liguei. A seguir comecei a sentir uma dor na perna que com o passar do tempo se foi intensificando. Dei por mim a coxear”. Lando, confessa-me que sempre pensou que se teria magoado numa das suas corridas, mas a prova de que alguma coisa não estaria bem aconteceu quando estava com a família à beira da água. Ao aperceberem-se da chegada de uma “onda marota” levantaram-se para fugir. “Fugiram todos, menos eu. Fiquei com o joelho no chão e foi aí que realmente me capacitei que teria um problema mais grave”. Recorreu de imediato a um neurologista e fez uma eletromiografia e a um ortopedista onde fez ressonâncias magnéticas e exames à coluna. Num dos relatórios médicos constava que o paciente poderia ter uma possível doença neuromotora, embora isso fosse pouco provável. Foi encaminhado para o especialista em doenças neuromusculares, o professor Mamede de Carvalho, que após mais alguns exames “me ditou a sentença”: esclerose lateral amiotrófica. Presentemente, Orlando é acompanhado em consultas regulares no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, onde é seguida a evolução da doença, que no seu caso é galopante. A onda de solidariedade é enorme. Desde os seus colegas de trabalho, aos amigos e aos vizinhos há sempre alguém pronto a ajudar, “é a minha sorte”, conta-me. Em relação à mobilidade refere que “os acessos em Portugal para pessoas com problemas físicos são péssimos. Mas as queixas não se relacionam apenas com os acessos. “A burocracia que envolve o direito a equipamento social é horrível”. Marta diz-me que neste momento estão à espera de ajuda para uma cadeira elétrica e para outro género de material específico para esta doença. A espera anda à volta de ano e meio. A educadora de infância na Escola EB1/JI Costa De Caparica e no momento a desempenhar funções de coordenadora do ATL, viu-se obrigada a deixar o emprego para dar assistência ao marido. “É um dia de cada vez. Cuidar das duas meninas e do Lando é uma vida de loucos. E agora com o fecho das escolas devido à pandemia de covid-19 ainda é pior. É muito complicado e diz-se em modo automático. Há dias complicados, outros muito complicados e ainda outros onde me apetece desaparecer”. Peço ao Lando para me confessar o que lhe diz a alma. “Tristeza pelas minhas filhas. Sinto saudades de tudo. Não falho com pai, mas não posso ser o pai presente a que estavam habituadas. Agora sinto que aproveitam as visitas dos meus amigos para brincarem com eles”. Comovido, diz-me que “não vou atirar a toalha ao chão. Todos sabemos que esta doença nunca irá por bom caminho, mas confesso que trocava um dia da minha vida a cem por cento, por todos os restantes”. A esclerose lateral amiotrófica (ELA) é uma doença neurológica degenerativa rara que evolui de forma progressiva, sendo a forma mais frequente de Doença do Neurónio Motor (DNM). Pensa-se que cerca de 10% dos casos tenha origem genética e estima-se que existam 3-5 casos de esclerose lateral amiotrófica por cada 100 mil pessoas da população geral. Atualmente, não existe cura, embora exista um fármaco cuja toma, quando iniciada numa fase muito precoce da doença, permite prolongar um pouco a sobrevida dos doentes com ELA. A solidariedade faz com que uma simples mensagem ajude a vencer a batalha por mais um dia. “Nesta fase espero ter a máxima qualidade de vida que conseguir porque quando um dia ficar acamado quero cá estar o menos tempo possível”. Ao terminar a nossa conversa, Orlando Silva disse-me ter ficado satisfeito quando soube que a lei da eutanásia tinha passado…