Dia Mundial da Criança
Decidi convidar para celebrar o Dia Mundial da Criança, alguns dos que mais sofreram com a pandemia, os idosos. Foi a forma que encontrei para honrar mais de um ano de perda. Para muitos dos idosos de todo o mundo foi até o seu último ano de vida. Uma meta imposta, cruzada à força e sem direito a pódio. O vírus manteve-os presos entre quatro paredes. Em casa ou em instituições, sem quaisquer visitas de familiares, sem poder estar perto dos seus amigos, ou até mesmo sem uma simples saudação de alguém que lhes fosse menos próximo. Viveram assustados e distantes de todos. Talvez até longe deles próprios com medo do inimigo invisível. Mantive contacto de perto com alguns e de uma forma ou de outra ia sabendo da sua saúde. Desafiei-os a trazerem ou a contarem algo da sua infância e o resultado foi gratificante. Hoje deixo-lhes este pedaço de vida, na esperança de que possam respirar ar puro e que não tenham de voltar à clausura. NOTA: Foi em 20 de novembro de 1959 que as Nações Unidas aprovaram a Declaração dos Direitos da Criança. Testemunhos: António Bastos Salgado, 92 anos “A bola entrou na minha vida desde miúdo. Comecei no Costa, depois fui para o Beira-Mar e acabei no Vitória de Guimarães. Quando estive no Costa ganhámos ao Benfica por 2-0 com dois golos meus”. António Joaquim da Silva de Sousa, 79 anos “Eram muitos a brincar na rua com carrinhos e bolas. Antes de sair de casa punha sempre na mochila um carrinho para depois brincar com a malta no recrio da escola. E as ruas eram autênticos campos de futebol, porque se houvesse um carro em cada rua já era muito”. Carlos Alberto Silva Casimiro, 73 anos “Quando era criança não havia parques infantis como há hoje, mas existiam baloiços e era uma das minhas brincadeiras preferidas. Gostava imenso”. Leopoldina de Jesus Vieira Antunes Martins, 84 anos “Os meus sapatos eram feitos com folhas de figueira e uns pauzinhos espetados para as segurar. No Minho e naquela altura não havia muito tempo para brincar, mas quando podia ia para a rua brincar com os amigos”. Maria Clara de Jesus Sousa, 55 anos “Gostava muito de brincar com as minhas bonecas, mas era a fazer croché que me sentia feliz. Cheguei a fazer toalhas de linho e ainda hoje continua a ser o meu passatempo preferido”. Maria da Conceição Barros de Moura Amaro, 81 anos “Na província eram tempos difíceis. Antigamente eu e as minhas amigas alinhavávamos as bonecas de trapo e as suas roupas e depois cosia tudo na máquina de costura da minha mãe. Foram muitas as agulhas partidas, o que a arreliava bastante”. Maria do Rosário de Jesus Sousa, 78 anos “Adorava brincar com bonecas, mas tinha de ser com as de outras miúdas de famílias com mais posses. A minha primeira boneca era feita de papelão e terá custado 20 escudos à minha mãe que trabalhava a dias. Achei que esteva suja e dei-lhe banho o que fez com que se desfizesse toda” Maria Guilhermina Silva Galinho Casimiro, 71 anos “Na minha infância adorava brincar, mas das coisas que mais gostava de fazer era brincar em casa com as minhas bonecas”. Maria Lucília Rodrigues Alves, 90 anos “O que mais gostava de fazer quando era pequenita era ir brincar com rapazes para a praia, mas eu é que mandava neles. Brincávamos na areia e fazíamos construções embelezadas com conchas que apanhávamos”. Carlos Alberto Rodrigues dos Santos, 82 anos “A minha paixão que já vem de criança sempre foram os barcos e o Mar. Aos 13 anos já procurava pedaços de cortiça para construir barquinhos. Mais tarde quando comecei a trabalhar desenhei um plano e construi o meu primeiro navio. Um barco à vela que se chamava Moby Dick. Depois adquiri mais barcos e fiz umas aventuras no mar até poder. Tive de fazer uma operação ao coração e hoje resta-me ver os outros navegar”. NOTA: Na foto o “capitão”, como é conhecido junto ao “Mary”, um dos muitos barcos construídos por si. Clarice da Assunção Santos Carreira, 81 anos “Nunca fui boa aluna. Gostava da escola, mas apenas para a brincadeira. Jogava à malha e à bola. Aos 14 anos como não dava nada nos estudos a minha mãe pôs-me a trabalhar na fábrica de conservas e assim continuei sempre até que uma operação à perna me obrigou a parar”. Maria Libânia Vaz Serra Anjo, 96 anos “Passava o meu tempo a brincar com as minhas bonecas e a fazer-lhes roupa. Depois ia com os meus amigos para a rua jogar à macaca, aos saltos, às escondidas e à malha. Subia às árvores com muita facilidade. Era uma verdadeira “maria rapaz”. Com 80 anos ainda consegui subir a uma árvore no quintal e adorei, porque lá em cima é um espaço onde sentimos muita liberdade”. Nota: Posa para a fotografia com uma boneca que já tem “60 e tal anos”. Umas das muitas bonecas que guarda com muito carinho.